.imagens retiradas aleatoriamente do Google. |
As estrelas ocupam os lugares na fila da frente. A lua espreita em cada janela da casa. A noite acabou de chegar. Fria, como sempre. A casa aquece. De calor humano, do calor que emana da lenha que vai sendo consumida na lareira. Inunda-se de cor. De vermelho, de verde, de dourado e prateado. Enche-se de luz. Das velas que ardem sem cessar. Do pisca-pisca que se mantém a tradição inalterável. Afoga-se em cheiros. Doces, salgados, picantes. A porta da rua abre e fecha sem parar. As pessoas vão chegando e trazem consigo aquele sorriso que é melhor que qualquer presente. Deixam-se acompanhar pela vontade de ajudar. Todos querem fazer tudo. E tudo se vai fazendo. Pouco a pouco, porque nesta noite não há pressas. As crianças viram a casa do avesso. Preparam tudo para a visita do velho senhor de barbas brancas. Dão asas à imaginação e magicam engenhos mirabolantes para provar aos graúdos que as prendas chegam de trenó. Alguns olham curiosos para a lareira. Escolhem a meia maior para lá prenderem. Outros, esborracham o nariz na janela gelada e colam os olhos lá fora, na ânsia de ouvir um ténue guizo. A mesa vai ficando composta. A toalha de época, os guardanapos a combinar. O serviço de louça especial para a ocasião. Os copos alinhados e os talheres a brilhar. O arranjo florido enaltece o centro da mesa. Acendem-se mais velas. Alguém, lá ao fundo na cozinha, diz que já está tudo pronto. Sentam-se todos na mesa. Os mais pequenitos lutam pelos lugares preferidos. A televisão foi substituída pela velha grafonola da avó que encanta com as melodias celestiais, como se de coros angelicais se tratasse. Escolhe-se o bacalhau. As batatas. Rega-se tudo com azeite e boa disposição. Come-se. Fala-se. Bebe-se. Ri-se. Convive-se. Vem a sobremesa. Todos adoçam a boca e o coração. É um desfile de doces e docinhos que vai passando pela mesa. Prova-se deste. Elogia-se aquele. E o tempo vai passando. As crianças inquietam-se. Está a chegar a hora. Chamam pelos pais. Estão nervosos. Ansiosos. Excitados. O brilho no olhar intensifica-se. No meio da algazarra, o mais pequenino – qual anjo caído – olha-me bem no fundo dos olhos. Num misto de alegria e confusão. Segreda-me ao ouvido que ouviu. Ouviu o guizo do Pai-Natal e diz que ele está a chegar. Treme de felicidade. Batem à porta. Vou com ele abrir. Não é ninguém. Desilude-se. Voltam a bater. Novamente sem ninguém. Atormenta-se. Quando regressamos à sala, as meias e os sapatos à volta da lareira estão a abarrotar. Há presentes de todas as cores. De todos os tamanhos. Com laços grandes e pequenos. Sacos e saquinhos. Estavam à nossa espera para começar a distribuição. Ele larga-me a mão. Corre para a cozinha onde deixou uma pequena merenda para aquela visita tão ansiada. Olha para o copo de leite. Meio vazio. Olha para o prato das bolachas. Quase todas comidas. Salta-me para o colo. Dá-me um sufocante abraço enquanto me presenteia com uma gargalhada. Está feliz. Muito. A sua ilusão perdura. Mais um ano. Entrega-se à onda de papel de embrulho que vai surgindo na sala. Desfruta de mais um natal naquela harmonia infantil que tanta inveja provoca àqueles que há muito deixaram de esperar pelas renas. É mais um natal que passa. Em família, como tantos outros. É mais um. Para aproveitar. Para depois recordar. E guardar sempre, sempre, esta magia no coração.
A todos, um óptimo Natal.